Há 3 anos uma pergunta nos atordoa: quem mandou matar Marielle? Seguimos sem respostas, mas não sem luta. Desde que a vida de Marielle Franco e Anderson Gomes foram interrompidas, ocupamos as ruas, a política, a mídia e nos espalhamos pelo mundo. Um sinal de que não seremos interrompidas e de que há resistência sempre que atentem contra uma de nós.
Quem atroz e covardemente pensou em acabar com a vida da cria da Favela da Maré, feminista, mulher preta e vereadora eleita da cidade do Rio de Janeiro, cometeu um grave erro. Marielle se multiplicou porque a sua bandeira também é o que faz muita gente caminhar. Gente que quase não tem voz nos espaços de poder, gente marcada pelas profundas desigualdades do Brasil. Sentimos medo, revolta, raiva e impotência muitas vezes. Sentimos tudo isso quando mataram a Marielle; o mesmo que sentimos quando morre um dos nossos, vítima de bala achada em operações policiais do Estado que têm sempre um território alvo, com cor, gênero e classe. Esses sentimentos também nos invadem quando vemos que o povo preto é o que mais morre vítima da Covid. Foi também o que sentimos quando da morte do menino Miguel de apenas cinco anos em junho de 2020.
Sangramos, porém aprendemos a organizar a nossa revolta, o nosso luto. As vozes que ainda clamam por justiça elegeram o legado de Marielle em diversas casas legislativas espalhadas pelo país. Temos mais mulheres no centro da política e esse é um caminho sem volta. Temos mais mulheres negras ocupando o parlamento e esse é só o começo de um caminho árduo. O cenário, na verdade, é bem preocupante, pois desde o assassinato de Marielle, outras companheiras também têm de lidar com ameaças e alterar suas rotinas. É o caso de companheiras negras como a deputada federal Talíria Petrone (PSOL RJ) e as recém-eleitas, covereadora Carolina Iara (PSOL SP) e a vereadora Erika Hilton (PSOL SP), primeira mulher trans a ocupar uma cadeira na Câmara Municipal da capital paulista, entre outras.
Querem nos fazer recuar, mas fincamos pés e bandeiras e não daremos nenhum passo atrás. Aliás, estamos na batalha para que o dia 14 de março se torne o Dia Marielle Franco de Enfrentamento à Violência Política contra mulheres negras, LGBTs e periféricas, uma iniciativa do Instituto Marielle Franco que já foi abraçada por dezenas de parlamentares.
14 de março. Nesta mesma data, décadas mais distantes, nascia Carolina Maria de Jesus, escritora, poetisa, compositora, mulher negra com uma vasta obra que o Brasil praticamente desconhece. Carolina foi certeira quando há 60 anos escreveu em Quarto de Despejo quem deveria governar o país: alguém que passou fome, pois para ela a fome também era professora.
Após 3 anos do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, seguimos com fome de justiça por esse ataque à democracia e por tantas feridas que rasgam o Brasil, agora ainda mais violentamente em razão da pandemia e de um desgoverno federal.
Carolina Maria morreu em 1977, mas somente em 2021 foi reconhecida pela UFRJ como doutora. O título demorou, porém é justo e nos fez vibrar. Lembrar Carolina para falar de Marielle é não deixar que a nossa causa fique esquecida. Mulheres pretas resistem desde muito e seguirão nas trincheiras de luta até que todas sejam livres. Lembrar os legados é crucial para seguir em tempos de violência e ódio escancarados. É vital porque também nos diz que somos um coletivo.
Que não passemos mais um 14 de março sem resposta é o que queremos, mas que não pensem que iremos ceder, repetiremos essa pergunta quantas vezes for preciso. A prisão dos executores de Marielle e Anderson, Roni Lessa e Élcio de Queiroz, não basta. Queremos saber quem é o mandante e qual é o motivo. Queremos justiça!
Confira o Dossiê 3 anos do caso Marielle e Anderson: https://casomarielleeanderson.org/