O fim da escravidão ficou longe de ser um processo de real libertação para os negros, não só no Brasil, com seu 13 de maio, mas no mundo inteiro. Vivemos ainda em uma sociedade de classes, onde a maioria de nós é oprimida e explorada para garantir os lucros da classe dominante. A parti do momento em que afirmamos que o racismo é estrutural, entendemos que o capitalismo é racista em sua essência, ou seja, em nenhum lugar do mundo, em nenhuma posição social, em nenhum período dentro do capitalismo moderno, podemos nós, negros e negras sermos livres.
No nascente desse novo sistema, quando as revoluções burguesas pareciam soprar ares subversivos e libertários, do Haiti ecoava em alto e bom som as vozes dos negros, abençoados por Ogum, evocando sua própria liberdade, arrancando-a, tomando o céu de assalto, fazendo com um feixe de luz se abrisse no céu escuro da escravidão que assombra os negros do mundo inteiro. Mas logo, o poderoso Deus ex machina Capital, dá seu golpe final e decreta que todos os negros serão livres! Para vender são mão de obra! É claro, muito mais barato.
O que vivemos cotidianamente é a miséria que o capitalismo nos impôs. A realidade de uma colônia que se tornou, o país que contem o maior “exército” de empregadas domésticas do mundo e que em sua maioria são negras; uma das maiores populações carcerárias do mundo que também em sua maioria é negra; trabalhos altamente precarizados ocupados em sua maioria pelos negros, terceirização; morte por abortos clandestinos; estupros; condições insalubres de moradia; transporte, saúde e educação altamente precarizados; violência policial; genocídio e mais milhões de outras coisas que poderia levantar aqui. Mas não só as condições objetivas de vida. O racismo também causa inúmeros impactos subjetivos em muitas de nós. Fanon, ao estudas a subjetividade dos negros nos países colonizados consegue expressar a miséria subjetiva que também é imposta aos negros.
E assim como já nos avisara Césaire, fica mais do que comprovado: “No fim do capitalismo, desejoso de se sobreviver, há Hitler”. A nossa realidade, negra, é verdadeira face da modernidade, é em nossa pele que se marca a tal “CIVILIZAÇÃO” de que tanto falam os homens branco. A concepção de humanidade moderna não nos serve, pois nos desumaniza. Essa modernidade, civilidade desenvolvida, ou qualquer nome que seja dado, na verdade é o Imperialismo que através das ações da burguesia evoca a voz e a ação de seus avós, os gigantes da escravidão. Nós sabemos de onde vem a fortuna da burguesia mundial, mas também sabemos de onde veio, todos os setores da burguesia do mundo inteiro construíram as fortunas que permitiram o desenvolvimento do capitalismo em cima de sengue negro, ou seja, o capitalismo nasce como um parasita que se alimentando do sangue negro que jorra das colônias direto pro mercado mundial.
Velhas histórias, falsas verdades, e no fim do dia, a mesma luta. Em toda América Latina e Caribe, a tradição de evocar nossos ancestrais foi mantida, apesar de perseguida, sempre. Para além das questões do campo espiritual, essa prática traz uma importante lição, deixada por nossos ancestrais: é preciso aprender com os que lutaram antes de nós, ainda vivemos a mesma luta! Passar por esse 13 de maio deve nos lembrar, que a história se repete, Marx disse, a primeira vez como tragédia, depois como farsa, eu diria que hoje já virou pornochanchada rs.
Os grandes senhores burgueses já pegam seus chicotes do armário, preparam seus cães de guarda. É dada a hora de construirmos nosso 20 de novembro! Não a data, mas o espírito, é hora de fazermos palmares de novo, ou melhor, é hora de fazermos do Brasil Palmares. Não é uma jornada fácil, se trata de uma luta altamente desigual, mas o Haiti nos mostrou que é possível. Para organizar a reunião que deu início ao processo de Revolução no Haiti, Cecíle Fatiman -uma Sacerdotisa Mambo- percorreu durante 4 anos a ilha do Haiti, sem essa organização não haveria essa revolução, foram anos de luta, batalhas contra os maiores e mais fortes exércitos da época, e, finalmente, eles conseguiram. Nesses dias sombrios, sob o céu cinza da escravidão moderna, cansados de pesadas correntes da terceirização, do genocídio, do encarceramento em massa etc. ainda podemos ver, se olharmos com cuidado, um flash de luz, que se mantem aberto pela força dos ecos de nossos antepassados que nunca se calou por ser revivida em toda luta dos oprimidos e explorados que ousaram se levantar contra seus algozes.