O que está em jogo na eleição do Andes-SN?

Por Gean Santana1 e Viviane Narvaes2

Nas eleições do Andes-SN que ocorrerão nos dias 7 e 8 de maio desse ano de 2025 quatro chapas se inscreveram para disputar a direção do sindicato. Essa aparente fragmentação tem muitas camadas que exigem um olhar cauteloso, principalmente por parte daqueles que não vêm acompanhando de perto as nuances que, muitas vezes, não aparecem em um primeiro olhar. Entendemos que é importante que cada professor e lutador de nossa sociedade compreenda o que está em jogo nesta disputa e quais as consequências para a luta dos docentes, de modo imediato, e para a luta da classe trabalhadora. Tentaremos ao longo desta breve análise apontar caminhos para responder a essa problemática.

O cenário em que se dá a eleição é permeado de grandes questões internacionais, quais sejam: o colapso climático, as caracterizações da intensa polarização política, os avanços do capitalismo contra os direitos sociais e a opção de parte da burguesia por fazer apostas em regimes de exceção para silenciar a voz da classe trabalhadora. Quanto às dimensões do grande capital, cabe também destacar a financeirização e plataformização que reconfiguraram o mundo do trabalho, disseminando os valores do empreendedorismo como véu para a precarização dos trabalhadores e intensificando o esvaziamento das organizações sindicais, dentre outros efeitos sobre os quais optamos por não falar aqui, uma vez que extrapolariam a proposta deste texto.

No caso brasileiro, é fácil perceber que todo o debate sobre o colapso ambiental passa necessariamente pela luta anticapitalista, conectada à luta contra o racismo, o machismo, a LGBTQIAPN+fobia, pois o agronegócio, a exploração do subsolo, o genocídio dos povos originários e das populações tradicionais são apenas algumas das facetas nefastas que atingem com especial requinte essas camadas da população.

O descontentamento social iniciado em 2013, somado à polarização política que se instaurou desde a crise social e econômica em 2015, impactou de modo grave a esquerda brasileira, que se dividiu em diferentes caracterizações, colocando partidos, movimentos sociais e sindicatos em disputas fratricidas acerca da constituição de frentes amplíssimas, como se estas fossem as ferramentas urgentes para barrar o bolsonarismo. Neste ponto há uma particularidade brasileira: lulismo e bolsonarismo constituem um todo uníssono na defesa dos interesses do grande capital e contra os direitos sociais, e até mesmo os direitos de existência de grande parte da população, operando necropolíticas.

A resposta da atual direção do Andes-SN a este estado de coisas foi retirar o sindicato de seu papel histórico de defesa combativa dos trabalhadores, para transformá-lo em aparelho burocrático fatiado por forças partidárias de conciliação com governos. O grupo que há mais de 10 anos se reproduz na direção do sindicato e que paulatinamente vem rompendo com a tradição democrática, horizontal e classista do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior é hegemonizado por uma corrente sindical chamada Andes de Luta e pela Base (ALB). Desse grupo fazem parte diversas correntes do PSOL e até há bem pouco tempo o PCB (este último fez uma carta manifestando divergência de método e se retirando da corrente sindical). 

Para fazer uma análise justa desse processo, cabe dizer que a responsabilidade por esse quadro não pode ser atribuída isoladamente à direção que se reapresenta agora nas eleições sob a Chapa 1. A ela se juntou outro agrupamento importante, aquele intitulado Renova Andes, formado pelo PT, que foi fundamental à direção no processo de conciliação com o governo. O exemplo mais notório disso ocorreu quando a diretoria e o PT se uniram no comando nacional de greve para dar fim à greve dos professores federais, proclamando por meio de comunicado que as Seções Sindicais fizessem assembleias para encerrar o movimento paredista, assinando um acordo rebaixado e comprometendo a carreira docente.

Nas eleições, os grupos se apresentam aparentemente separados em três das quatro chapas (Chapas 1, 2 e 4). Entre elas há um ponto em comum: a adesão ao programa do lulismo, pois as forças e organizações que as compõem estão na base aliada do governo. As chapas comungam também na concepção sindical: privilegiar a ação institucional em detrimento de apostar na mobilização da categoria docente; promover suas alianças com governos e reitorias, colocando de lado a defesa dos direitos dos professores, e, finalmente, disseminar uma política do pânico em que tudo é aceitável diante da ameaça do fascismo. 

Não são só semelhanças o que une esses grupos, há uma diferença tática: aqueles que compõem a chapa 4 são do setor mais conservador e antigreve do PT. A corrente “O Trabalho”, que forma a chapa 2, mesmo quando o PT criou seu braço sindical – o Proifes –, permaneceu no Andes. Agora, aliançada com a ALB, fez uma chapa em separado, garantindo a permanência do grupo atual no poder.

A chapa 3 é uma chapa de unidade de setores díspares da esquerda classista, formada por grande maioria de militantes independentes das correntes sindicais Rosa Luxemburgo (maioria de independentes), CAEL (PSTU), CPO (POR) e ART. É a alternativa que chama para um programa que se diferencia do sindicalismo de resultados subserviente ao governo. Em seu programa, o anticapitalismo se traduz na luta pelos direitos das negras e negros, das LGBTQIAPN+, das pessoas com deficiência, das mulheres, dos povos indígenas, ciganos e população quilombola, enfim, da classe trabalhadora em sua diversidade. Coloca-se em defesa da educação pública e de salários e condições dignas de trabalho, contrapondo-se à oligopolização e financeirização da educação. Num momento em que as políticas de cotas conseguem dar seus primeiros frutos, a educação pública sofre um de seus mais fortes ataques, vindo de governos municipais, estaduais e federal, que privilegiam os interesses do capital em detrimento dos interesses da classe trabalhadora. Nossas bandeiras não são menores, pois lutar pela educação pública é também lutar pelo direito da juventude preta, pobre e periférica de acessar e permanecer nas Universidades, Institutos Federais e Cefets.

Nosso programa apresenta a alternativa para recolocar o Andes no caminho do classismo, da luta aguerrida por direitos. O medo não pode manter nosso sindicato imobilizado. Manter o ANDES nas mãos daqueles que constroem o apaziguamento dos trabalhadores é contribuir para o fortalecimento dos setores mais conservadores de nossa sociedade, garantindo que não haverá força na luta dos professores para enfrentar quaisquer governos e ataques do capital. Nós, da chapa 3, acreditamos que só com real autonomia e independência teremos forças para contribuir para a organização das lutas em prol da educação pública, gratuita, inclusiva, antirracista, de qualidade e socialmente referenciada.

Referências

  1. Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana desde 2004. Foi diretor do Andes-SN entre 2012 e 2016. Quando esteve na direção do Sindicato Nacional, coordenou o Setor das Estaduais e Municipais e o GTPCEGDS. Em 2011, esteve na direção de uma das maiores greves das Universidades Estaduais da Bahia, coordenando o Fórum das ADs. Além da atuação no movimento docente, estadual e nacional, tem realizado pesquisa sobre o câncer ocupacional nas atividades agrícolas e nos serviços gerais. Na extensão, tem atuado na saúde da trabalhadora e do trabalhador
  2. Professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro- Unirio. Foi presidente da Adunirio. S. sind do Andes na Unirio de 2013 a 2015. Atualmente coordena, em parceria com outros docentes da universidade, o Programa de Extensão Cultura na Prisão e é líder do Grupo de Pesquisa no Diretório do CNPq – Observatório de Práticas Artísticas no Cárcere e em espaços de privação de liberdade.

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