O vídeo de Lula

por Milton Temer1

O VÍDEO DE LULA, apresentando Galípolo ao grande público, é o epílogo perfeito de uma pantomima anunciada na forma como se aprovou o Pacote do “Corte de Gastos” do governo. Cena típica de ventríloquo e seu boneco, Lula trata Galípolo como um pupilo a quem destina tarefa “autônoma”, mas prevenindo-o de que é produto de um processo com cara e voz de um dono. Oximoro transmitido ao vivo e a cores, destinado, em um mal disfarçado “me engana que eu gosto”, tanto à sua base social quanto aos “agentes econômicos” – título pomposo dado aos especuladores parasitários do dito “livre mercado”.

EPÍLOGO mais coerente não poderia haver para uma novela de curtos capítulos deliberativos, em que um outrora pesquisador marxista, Fernando Haddad, auxiliado por uma liberal convicta, Simone Tebet, e tendo como espécie de executor oculto um neoliberal de raiz, Bernardo Appy, aparece como algoz, com Lula posando de freio de contenção, na avalanche de medidas que fazem com que os segmentos mais vulneráveis da população se vejam ainda mais mergulhados no pântano de uma desigualdade social pornográfica.

PACOTE DE CORTE DE GASTOS que não toca em Teto, nem cogita de inverter a lógica atual da escala de impostos, onde o recolhido no consumo, em que pobres pagam tanto quanto ricos, se impõe de forma aplastante na composição da Receita do Tesouro, na convivência com uma leniência incessante em relação a patrimônio e renda. Onde isenções ao grande capital – visto como “produtor de empregos” e não como explorador da força de trabalho – são intocáveis. Onde não se cogita de corrigir a brutal injustiça da cobrança de IRPF, em que os que menos ganham e têm são os que, proporcional e até absolutamente, mais pagam. Pacote, enfim, que não permite anunciar Reforma, mas sim perversa Contrarreforma Tributária.

NÃO FOI SURPRESA, portanto, que nos víssemos obrigados a assistir a uma tribuna da Câmara dos deputados ocupada por parlamentares do neoPT esgrimindo, na defesa do “ajuste fiscal” como operação necessária para a “sustentabilidade” dos Direitos Sociais, argumentos semelhantes aos vocalizados por parlamentares do tucanato de FHC, na defesa da privataria daquele mandarinato. Um verdadeiro circo de horrores, com o neoPT e seus acólitos realizando o transformismo necessário para serem substitutos diretos do falecido PSDB.

O QUE CABE à Esquerda combativa neste cenário? À Esquerda que não se rendeu a um indefensável defensivismo imobilista por conta de uma “ameaça fascista”, cuja forma de barrar é exatamente não lhe deixando os espaços vazios do “contra tudo isso que está aí”?

ANTES DE TUDO, precisa ter capacidade de impedir que sejam Lula e seus acólitos no neoPT os caracterizados como tal pela lavagem cerebral da grande mídia corporativa. E, para tanto, afirmar seus valores e firmeza na apresentação de identidade e programas próprios, com demandas estruturais que alcancem a grande massa de trabalhadores ora esgarçados na uberização, na terceirização, na informalidade ou até no desalento da desesperança; que não se condicione ao “menos pior” em razão de um eleitoralismo raso que joga para as calendas a perspectiva do combate anticapitalista como forma de desconstruir e superar esse regime que não cessa de nos empurrar para a barbárie.

AS CONDIÇÕES SÃO difíceis? Sem dúvida. Mas quando, em toda a História da Humanidade, foi fácil a luta e revolta dos oprimidos contra seus opressores? 

QUE AS FRAÇÕES que não se vendem nem se rendem, hoje presentes até no neoPT e em sua bancada federal, mantenham seus combates. 

Elas hão de ver seus frutos. Desesperançar, jamais!

Luta que Segue!!

Referências

  1. Milton Temer é jornalista e militante político. Foi oficial da Marinha, cassado no golpe de 1964, além de deputado estadual e deputado federal pelo Rio de Janeiro.

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