Por Epitácio Macário1
Em pelo menos 16 capitais e 22 Estados houve manifestações massivas hoje (29/05/21) com destaque para São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.
A grave crise humanitária em que o povo foi jogado, seja pela política genocida de Bolsonaro em face da pandemia ou da política econômica comandada pelo chicagano Guedes, obriga o povo a ir às ruas reivindicando vacina no braço, comida no prato e o fim do governo central.
Foi uma demonstração de que o aprofundamento do conflito social pode ter uma direção política progressista e, quiçá, capaz de enfrentar as milícias, as polícias de orientação fascista, a militarização do governo e de instituições sociais e as ameaças de fechamento do regime.
Sim, esta é uma possibilidade aberta pelos atos de hoje, ainda que não se tenha no campo organizativo – partidos, sindicatos e movimentos populares no espectro de esquerda – qualquer alternativa esboçada, qualquer programa que aponte para uma saída de conjunto à grave crise ora em curso.
Via de regra, forças tradicionais do campo progressista têm apostado apenas nas eleições de 2022 como uma espécie de ultimum tempus para a resolução da crise, muito embora a abrangência e profundidade desta – assomada à derrota imposta sobre as forças do trabalho desde 2014 – traiam mesmo os mais apaixonados por lideranças como Lula da Silva e Ciro Gomes – para citar exemplos de dois homens do campo progressista com incidência na politicalha que grassa no país.
O apego a esperanças que sequer sabem identificar as forças sociais reais capazes de materializá-las é o que tem dado o tom dos nossos discursos – que já sabem dizer #EleNão e #LuteComoUmaGarota.
É um começo: saber o que não se quer, e dizer #ForaBolsonaro é contrapor-se ao genocídio. Qualquer titubeio em face dessa poderosa palavra de ordem torna o sujeito cúmplice, se não agente, da monstruosidade que é a mente e a orientação política desse traste e de seu séquito.
Invocar a rebeldia e a força de vontade de uma garota tem poderoso apelo simbólico. Pois, muitas vezes, ensina um revolucionário do século XX, as ações sociais massivas é que lançam luzes sobre a realidade, favorecendo o conhecimento, a teoria, o projeto, o programa.
No mais das vezes, porém, é bom lembrar que sem teoria revolucionária não há revolução.
Eis porque o bom senso aconselha ir além das frases de efeito que resolvem crises como num passe de mágica. A eleição. Ah, a eleição de 2022! Se ela ocorrer!
É preciso dizer também, e sobretudo!, que será necessário reorganizar as lutas por direitos humanos, as batalhas cotidianas por cidadania de negros, mulheres, comunidades LGBTQIA+, juventudes sob a bandeira unificadora das forças do trabalho.
Sob diagnóstico criterioso da crise e das forças sociais nela atuantes, é necessário encontrar as mediações pelas quais os diversos movimentos exerçam força unitária para destituir o genocida Bolsonaro e seu governo ou para derrotá-lo nas urnas; ato contínuo, estas mesmas forças urdidas em torno do trabalho terão que enfrentar o próximo governo, pois este responderá primordialmente aos interesses das classes dominantes – as mesmas que se nutrem e destilam ódio secular contra pobres e trabalhadores por meio dos atos criminosos de Jair Bolsonaro.
Estas batalhas mais amplas contra o poder incrustado no governo central brasileiro – cuja destituição é, hoje, uma questão humanitária! – tem de se realizar sobre a base dos elementos que atingem o cotidiano, a vida, da ampla maioria do povo. Vacina no braço, comida no prato e fora Bolsonaro só podem se materializar nas ações concretas por emprego, contra a carestia, por restaurantes populares, por salários, por serviços públicos de qualidade, em defesa do SUS.
Quem separa pautas tão imediatas quanto dolorosas para segmentos do povo trabalhador das questões mais gerais cai em contradição profunda, ou está empenhado em enganar o povo trabalhador.
Eis porque não é uma pauta menor ou comezinha o emprego, a comida, os salários, as condições de trabalho, o posto de saúde do bairro, o restaurante popular.
Por isto, ao mesmo tempo que alimento esperanças nos atos que hoje ocorreram em todo o Brasil dirigindo-se a Bolsonaro e seus comensais da morte, também condeno com toda minha força a atitude do governo do Ceará que editou ato discriminando, aviltando, humilhando o trabalhador e a trabalhadora do ensino.
Acuso Camilo Santana de covarde e traiçoeiro ao impor como condição da vacinação de professores e professoras cearenses a assinatura de um termo que os/as obriga a retornar ao ensino presencial no segundo semestre deste ano.
Aproveitar-se do medo da morte que nos acomete a todos para desferir um golpe político contra uma categoria de trabalhadores e condicionar o acesso a um direito humano fundamental – a vacina tem de ser encarada assim, pois diretamente ligada à preservação da vida – a uma chantagem política, mesquinha e desumana representam uma ignomínia.
Nesse momento, é preciso voltar nossas armas – a arma da crítica e da mobilização – também contra Camilo Santana que já confiscou mais de 30% de nossos salários e agora vem com essa atitude covarde e servil aos que desejam que a morte faça seu estrago também nas escolas e universidades.