14 de Julho, o dia da libertação

O 14 de julho de 1958 é um marco para o povo iraquiano: o dia da libertação contra a Monarquia Hachemita. A Dinastia já havia sido derrubada por um golpe, com a ajuda dos fascistas, mas voltou ao poder depois da segunda guerra mundial, a partir da intervenção britânica.

Oriundo de um sentimento anti-imperialista e no bojo do movimento pan-árabe nasserista, que pregava a integração árabe em um único Estado, um grupo secreto de militares, conhecido como “Movimento de Oficiais Livres”, liderado por Abdul Salam Arif e Abdul-Karim Kassem, mudou os planos de uma movimentação militar monarquista e tomou Bagdá. Após a tomada do poder, as relações entre Sunitas, Xiitas e Curdos se intensificaram, consolidando um conselho denominado “Majis”, que tentou governar o país.

Em 1958, os latifundiários controlavam quase 70% do território, enquanto milhões de pequenos agricultores partilhavam os 15% restantes das terras cultiváveis. O preço do petróleo estava em ascensão, mas a riqueza era concentrada nas mãos da corrupta família real, que havia cedido os poços à Iraq Petroleum Company, uma companhia britânica. Com a revolução, foram iniciadas a reforma agrária, um plano de nacionalização do petróleo e a abertura política (legalização de partidos). Outras medidas importantes incluíram o sufrágio universal, a criação de um sistema de saúde e educação públicas, de bairros populares, direito de divórcio para as mulheres e maioridade aos 18 anos

Não há revolução sem contrarrevolução

O povo tomas as ruas em 14 de julho de 1958 em Bagdá

No entanto, há uma sucessão de fatos muito intensos nos anos seguintes, que interromperam a revolução de julho. Eles envolveram tanto o fato de o líder Abdul-Karim Kassem ter tido pai sunita e mãe xiita, quanto sua aproximação com os socialistas. Vamos tentar aqui elencar alguns marcos que fizeram a história da República iraquiana ser tão breve.

1 – Uma cisão com os Curdos, ao tentarem criar um Estado para seu povo: os curdos são o maior povo despatriado do mundo, somando 30 milhões de pessoas que vivem em uma região chamada de Curdistão, que se espalha por 6 países. Eles têm língua e tradições próprias, mas até hoje não conseguiram um espaço nas fronteiras traçadas pelas classes dominantes.

2 – Uma cisão dentro da organização militar: os líderes da revolução Abdul Salam Arif e Abdul-Karim Kassem começaram a apresentar diversas diferenças. Salam era membro do partido Baath, que visava a uma união Árabe. Já Kassem era mais próximo dos socialistas árabes. Houve uma tentativa de golpe fracassada por parte de Salam Arif, que o colocou na cadeia e provocou um rompimento de Kassem com o pan-arabismo do Baath. A tentativa de golpe foi motivada pela maior aproximação de Kassem com os socialistas e por sua agenda mais nacionalista e menos Nasserista.

3 – Há uma nova classe dominante em ascensão. Uma classe que mistura a pequena burguesia urbana e os oficiais, mas muito diferente da união desses setores no Brasil. Essa classe tem uma agenda progressista de reforma agrária e distribuição da riqueza. Há um sentimento muito antiocidental, o que fez com que Moscou tivesse muita influência na produção dos quadros políticos do país.

Kassem foi derrubado pelo Baath de Arif, aquele que também fez a revolução de 1958. A execução de Kassem foi transmitida ao vivo em rede nacional. Há fortes indícios de financiamento britânico neste episódio.

Arif e a “Revolução Ramadã” duraram menos de 10 meses, de fevereiro a novembro de 1963, quando Ahmad Hasan Al-Bakr assumiu o poder, retornando a força aos socialistas árabes, aproximando o país do bloco soviético e dando mais independência aos curdos.

Em 1979, Saddam Hussein, que já havia participado do golpe contra Kassem e era vice-presidente de Hasan, deu um golpe palaciano com a ajuda síria e governou até sua queda, na segunda guerra do golfo, em 2003.

A igualdade social tão almejada na revolução de julho ainda não foi conquistada. O Iraque continua sendo um país riquíssimo, mas extremamente subdesenvolvido e desigual. Ainda vive as mazelas de uma guerra que foi iniciada em 2003, mas ainda não chegou ao seu fim.

Vídeo do dia 14 de julho de 1958, em Bagdá

Marino Mondek

Pedagogo, comunicador e editor do Contrapoder

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