A frente ampla é a saída?

O bom resultado do PSOL tem que servir para fortalecer as lutas

A expressiva votação do PSOL, com a ida ao segundo turno em São Paulo e o fortalecimento de Boulos como liderança da esquerda, a vitória eleitoral de Edmilson, em Belém, e o aumento da bancada de vereadores em cidades e capitais importantes foi um importante salto para o partido. Nós, da CST, fomos parte dessa batalha.

Passadas as eleições, agora é hora de o PSOL aproveitar esse capital político conquistado nas urnas para colocar seus representantes, como Boulos, Edmilson e as bancadas de vereadores, a serviço de fortalecer as lutas contra os ataques de Bolsonaro, dos tucanos e da direita que seguirão no próximo período. Um sentimento fundamental dos eleitores do PSOL foi o de enfrentamento a Bolsonaro e apoio às pautas negras, feministas e LGBTs, em contraponto à extrema direita. Por isso, devemos usar esse voto para realizar ações de oposição nas ruas. Além disso, buscar canalizar esse bom resultado para uma política de independência de classe.

O equívoco da política de frente ampla

Com o avanço eleitoral conquistado pelo PSOL, é necessário também fazer o debate sobre qual o melhor caminho para derrotar a direita e como construir uma verdadeira saída radical, que resolva os problemas mais sentidos pela classe trabalhadora, pela negritude, pelas mulheres e pela juventude. Nesse sentido, temos alertado, desde o primeiro turno, que o caminho das alianças amplas com programas de conciliação de classes e o diálogo e cooperação com os setores da burguesia é uma política equivocada.

Em São Paulo, por exemplo, no segundo turno tivemos a aparição de Lula, Ciro, Marina e Flávio Dino no programa de TV do PSOL, reuniões e compromissos firmados com setores empresariais, como a ACSP, e um discurso mais light de compromisso com a “responsabilidade fiscal” e com a “governabilidade”. Enquanto isso, foi a radicalidade de ter um candidato liderança dos sem-teto e uma frente eleitoral de esquerda, com PCB e UP que gestou um fenômeno eleitoral massivo no primeiro turno, assustando a burguesia de São Paulo. Uma frente de esquerda semelhante obteve bons resultados com Áurea, em BH.

A conciliação de classes não é uma saída

É muito importante relembrar que muitos ativistas que fizeram o “vira voto” do segundo turno de 2018 se chocaram com o abstencionismo de Ciro Gomes, que ficou em Paris, enquanto aqui nós batalhávamos contra a extrema direita nas eleições e nas ruas, através do Ele Não. Ao mesmo tempo, muitos ativistas concordaram com o discurso de Mano Brow no comício da Lapa, no Rio de Janeiro, pois ele teve coragem de dizer que ocorreram muitas falhas e problemas no projeto do PT no antigo governo federal. Mais recentemente, vimos que muitos ativistas ficaram preocupados ou indignados com atitudes de governos estaduais no Nordeste, pois eles aplicaram medidas de ajuste fiscal e repressão contra os movimentos e foram parte da flexibilização das poucas medidas de isolamento social que existiram em algumas cidades. Logo após a posse, eles se diziam trincheiras de oposição à extrema direita, mas terminaram se adaptando aos projetos de Paulo Guedes e Rodrigo Maia. Fizeram reformas da previdência estaduais, ataques a universidades, como na Bahia, militarização de escolas e repressão aos atos antifascistas, como no Ceará. Nada fizeram para convocar uma mobilização regional e nacional em defesa da orla nordestina. Do mesmo modo, jamais questionaram o pagamento das dívidas estaduais junto à União e aos bancos que alimentam o sistema financeiro, nunca se dispondo a realizar uma frente de governos estaduais pelo não pagamento da dívida, canalizando recursos para áreas sociais. E tudo isso ocorre porque são governos formados em coligação com partidos de direita, que acabam governando para a burguesia. São governos de conciliação de classes.

Entendemos que não é possível defender os interesses dos de baixo sem enfrentar os poderosos. Dessa forma, não podemos seguir o exemplo de governos como os do PT, na Bahia e no Ceará, ou do PCdoB, no Maranhão. Não por acaso, esses partidos tiveram baixos resultados eleitorais nesses estados. A política de conciliação também se expressou no segundo turno em capitais como o Rio de Janeiro e Fortaleza, onde setores importantes do PSOL estiveram engajados na campanha de candidatos da direita, o que vemos como um erro que não fortalece a batalha contra a extrema direita.

Uma proposta alternativa: batalhar para construir um polo que lute por uma Frente Esquerda Socialista

De forma diferente, a nossa alternativa deve ser gestada com os setores que estão na luta e não governaram, como os nossos aliados do PCB, da UP e os movimentos sociais combativos, como o MTST. Com a frente junto ao PCB e à UP, o PSOL foi ao segundo turno em São Paulo, obteve bom resultado em BH e conquistou novas cadeiras nas câmaras municipais em lugares como Rio de Janeiro e Porto Alegre, eleitas sob a base de uma frente eleitoral classista. Isso é importante pois demonstra que é possível disputar setores de massas sem abrir mão de um projeto de independência de classe.

Da mesma forma, na Argentina, temos o exemplo da FIT-Unidad, que sob as bases da independência política da classe trabalhadora, sem conciliar com setores da burguesia e sem se confundir com a esquerda da ordem, consegue apresentar um projeto alternativo de esquerda nas eleições, fortalecendo as lutas, conquistando cadeiras no parlamento e construindo uma alternativa de esquerda e socialista.

Entendemos que precisamos refletir sobre esses fatos e sobre essa experiência da Argentina. Junto ao chamado da mais ampla unidade de ação nas lutas, devemos nos engajar no diálogo visando o fortalecimento de um polo que atue para construir uma Frente de Esquerda Socialista, com os setores combativos do PSOL, PCB, UP, MTST e CSP-Conlutas, e também fazendo um chamado aos companheiros do PSTU, que chamaram voto crítico no PSOL no segundo turno. Passado o processo eleitoral, essa segue sendo tarefa fundamental dos socialistas.

Danilo Bianchi

Professor de história, militante da CST.

Um comentário sobre “A frente ampla é a saída?

  • 27 de dezembro de 2020 at 8:32 pm
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    Achei a análise bem fraca. Chamar o resultado eleitoral da áurea Carolina em BH, por exemplo, é muito errado. Eu sou de BH. O sucesso eleitoral fenomenal de Alexandre Khalil deve-se unicamente ao seu jeitão ranzinza e zangado. Ora, perante a atual situação catastrófica é óbvio que o povo vai simpatizar com alguém que pareça ter “sangue nas veias”. Daí qual a estratégia de campanha da Áurea? “É melhor ser feliz do que ser triste” e áurea Carolina sempre sorrindo tranquila e satisfeita. Estarrecedor… Não é atoa que mesmo a Globo dando tanta visibilidade para a áurea Carolina (afinal a Globo adora uma “esquerda” bem comportada), ela conseguiu chegar em terceiro, atrás de um desconhecido da ala da direita Bolsonarista.
    É uma ofensa ao povo sorrir citando trecho de musica composta por morador da zona sul do Rio de Janeiro. É melhor ser feliz do que ser triste? Talvez para uma esquerda viciada em entorpecentes, classe média e universitária, pós-moderna, para o resto do povo tão somente demonstra completa desconexão com a realidade (que é de crise catastrófica não é???). Essa leitura eleitoralesca de conta de votos, aritmética, é exatamente o que nos trouxe a este buraco. Ainda que talvez Áurea Carolina tenha tido mais votos, como Boulos, a derrota política que eles representam é muito, mas muito mais importante. A degeneração, banalização, vulgarização do discurso é muito maior e pesa muito mais que estes votos que afinal não serviram para nada. Saiam da bolha.

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