Não é apenas um “ensinozinho remoto” é um projeto do capital!
Um vírus ronda a Universidade pública. Sucessivos governos implementam projetos que avançam para a privatização e a precarização dessa instituição social. Ações de combate como greves, atos, paralisações foram a vacina adotada e, assim, resistimos.
Inesperadamente surge outro vírus, que nos afasta presencialmente da universidade, favorecendo a doença crônica e oportunista do capitalismo. Os organismos internacionais, a pretexto da pandemia, tentam difundir um modelo de educação referenciado na agenda empresarial, que há anos é defendido pelo capital. Os agentes “intelectuais”, como Banco Mundial, OMC e CEPAL, ao ditar as diretrizes educacionais, recomendam que sejam fornecidas oportunidades de aprendizagem remota no período em que durar a interrupção das aulas para “diminuir” as perdas da paralisação do calendário escolar. Será que a preocupação desses agentes do capital é mesmo com o destino da maioria?
Com a crise sanitária, humanitária e social aguçada pelo coronavírus, as Universidades seguem na produção do conhecimento, com pesquisas para combater as doenças e melhorar qualidade de vida do povo. Isso se dá também como processo de resistência à política de destruição da educação pública, com cortes em seu orçamento, ocorridos mesmo antes da pandemia – desde 2015, com aprofundamento a partir da EC 95 (que congela os orçamentos sociais por 20 anos para garantir a política de juros e remuneração da dívida pública).
O discurso governamental de combate à crise pandêmica tem a intenção de asfixiar ainda mais os investimentos em políticas sociais. A PEC 10/2020 (“orçamento de guerra”) retira do orçamento destinado às políticas sociais a maior parte dos recursos para combater a crise provocada pela Covid-19. A Lei Complementar 173/2020, com medidas de auxílio financeiro a Estados e municípios durante a pandemia impôs congelamento salarial até o final de 2021; incorporações e adequação de remuneração no serviço público da União, de estados e municípios; e suspensão de concursos públicos. O arrocho fiscal promovido pela LC 173/2020 é de fato uma “granada” no bolso dos servidores.
Outros ataques estão sendo orquestrados. Rodrigo Maia e Paulo Guedes anunciam a reforma administrativa. O governo transfere a responsabilidade da crise econômica e os efeitos da pandemia para a classe trabalhadora. Para as Universidades e Institutos Federais as consequências são danosas: previsão de corte de 1,4 bilhão do orçamento para 2021. Tudo para preservar e avolumar o recurso destinado ao capital financeiro nacional e internacional.
No governo Bolsonaro, há um elemento a mais além dos cortes: há um projeto político destinado a desmoralizar e desqualificar o ambiente acadêmico. E a pandemia também permite que os oportunistas de plantão adentrem a universidade pública através do ensino remoto emergencial. Isso é articulado com outros ataques: a nomeação de reitores não eleitos, a tentativa de extinguir a política de cotas na pós-graduação, prosseguimento ao projeto do “Future-se”.
Esse processo só é levado adiante pelos aliados que o governo encontra em nossas instituições. No início da pandemia, a movimentação do MEC para implementação de aulas via ensino remoto foi rechaçada pela comunidade acadêmica, inclusive pela maioria das reitorias. Mas, com o passar do tempo, muitas reitorias usam o discurso de “preocupação” com calendários, prazos, e avançam na regulamentação do trabalho e ensino remotos. Buscam nomes novos, como “atividades mediadas por tecnologias digitais no contexto de pandemia” ou “ensino remoto emergencial” para escamotear a adoção de modelo improvisado de ensino à distância.
Em várias universidades formulários são enviados a docentes, estudantes e técnicos. Indicam que se trata de pesquisa para avaliar as possibilidades de implantação do ensino remoto. Na prática tal instrumento é apenas para legitimar a política já em curso. Muitos docentes acabam por aderir esse processo sem questionar como esse projeto leva à exclusão de parte considerável dos discentes. Isso também expropria a própria categoria com a ampliação da jornada de trabalho em condições precárias, a responsabilização exclusiva pelos meios necessários às atividades, a instituição de forte controle externo sobre suas atividades acadêmicas e ainda a desvalorização profissional.
Esse modelo aprofunda a desigualdade de acesso, atingindo estudantes negras e negros, pessoas com deficiência, mulheres, LGBTs e toda a periferia. Tal acesso não pode ser reduzido à chips e outros serviços e instrumentos necessários. Pois há uma questão de fundo: o que significa estar na Universidade?
O futuro da universidade está ameaçado por interesse das corporações para vender pacotes da EAD. Neste momento a prioridade deveria ser salvar vidas. Isso implica em destinar mais recursos para a educação pública. Faz-se necessário reafirmar e valorizar o papel das Universidades públicas na produção do conhecimento público, gratuito e universal. Reforçar ainda mais a indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão.
A universidade pública está mais uma vez em disputa! Podemos escolher ser “entregadores de tarefas” ou protagonistas pela emancipação do trabalho humano. E, por compromisso e responsabilidade, com as atuais e futuras gerações, temos que resgatar a nossa memória e tradição de luta em torno da educação.
Questões muito bem colocadas.