O óleo derramado

O óleo nas praias, a rebelião brasileira em banho-maria e as insurreições em ebulição na América Latina

O mundo vem passando por grandes desastres ambientais, causados pela interferência criminosa do homem na natureza. Só no Brasil, vivenciamos uma sequência de ecocídios: o rompimento da barragem da Vale, os incêndios na Amazônia e o acidente da vez, o vazamento de petróleo em alto mar, que atingiu mais de 494 pontos em 111 cidades do Nordeste e Espírito Santo, desde o início de agosto.

Assim como os incêndios na Amazônia, o vazamento de petróleo que atingiu as praias brasileiras tem como resposta do governo a total omissão e fuga de responsabilidade. Para crimes como esse existe um protocolo a ser acionado, aprovado em 2013, chamado PNC (Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo). Consiste em uma série de medidas organizacionais e metodológicas para atribuir as responsabilidades a diversos órgãos, dando uma estrutura e organização financeira e permitindo que os Estados sejam chamados ao grupo para participar das decisões ou acompanhá-las. Ou seja, estabelece uma organização na resposta do país à crise.

Porém, passados mais de 50 dias, o governo não acionou tal medida! O MPF moveu uma ação na Justiça Federal para a ativação do PNC. Na ação consta que a União tem sido “omissa, inerte, ineficiente e ineficaz”. O resultado disso é milhares de pessoas tendo sua vida prejudicada, como pequenos pescadores, que tem toda sua fonte de sobrevivência oriunda do mar. Além disso, a vida marinha está mais uma vez totalmente ameaçada. Diversas espécies de animais marítimos cobertos de óleo foram encontradas. A resposta do governo Bolsonaro e do seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (NOVO), é de um ataque totalmente irreal a ONGs e à sociedade civil organizada, que em contrapartida está se auto organizando para limpar as praias diante da ausência do governo federal.

Além dos mutirões auto organizados para limpeza das praias, houve manifestação em frente ao Palácio da Alvorada. Os manifestantes jogaram óleo e árvores queimadas em frente à casa do presidente. Após o fim do protesto, a polícia levou detida 19 pessoas. O time de futebol Bahia entrou em campo com camisas manchadas de óleo. E, na sexta-feira (25/10), aconteceram diversas manifestações pelo Brasil inteiro. No Rio, houve intervenção nas barcas, com manifestantes sujos de óleo, exigindo respostas. O ministro do Meio Ambiente classificou a justa revolta popular como ecoterrorismo. Precisamos dar um basta nessa política de extermínio da natureza, consequentemente, da espécie humana.

A América Latina está em ebulição. No Equador, gigantescas mobilizações indígenas se levantaram. Agora, foi a vez da Chile demonstrar seu poder popular contra os resultados de anos de neoliberalismo genocida e da Constituição de Pinochet. E, como se não bastasse, o governo convocou o exército para conter as manifestações, resultando em diversas mortes, abusos e prisões. Na Bolívia, um golpe orquestrado pela extrema direita, e referendado pelo Bolsonaro, tomou o palácio. Porém, os camponeses e indígenas já estão se mobilizando com a palavra de ordem “Agora sim, guerra civil!”. A COB (Central Operária da Bolívia) convocou greve geral por tempo indeterminado para resistir ao golpe. Quando será a vez do Brasil de mostrar a sua força popular? A reforma da previdência foi aprovada em 2ª votação no senado, sem nenhuma mobilização popular convocada pelas maiores centrais sindicais. Quais os interesses por trás dessa desmobilização?

Não há mais como assistirmos à destruição do nosso país. A palavra de ordem “Fora Bolsonaro” deve ser entoada sem medo. Não há como cairmos na falácia da vitória na disputa eleitoral, quando o governo eleito de Bolsonaro realiza diversas ameaças à democracia. Só a mobilização popular e a organização nos bairros, escolas e locais de trabalho são a saída possível para essa crise socioambiental profunda que estamos sofrendo.

Renato Cinco

sociólogo, ex-vereador carioca e coordenador do Grupo de Estudo Ecologia e Marxismo.

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