Os pássaros caem em pleno voo: Índia e Paquistão: ondas de calor

Por Tamy Cenamo1 e Silvia Beatriz Adoue2

04/06/2022

Com temperaturas que chegaram a 44ºC na Índia e 49ºC no Paquistão, uma onda de calor atinge os dois países em plena primavera

Os pássaros caem em pleno voo. As plantações de manga murcharam as flores em plena primavera. Quem pode escolher, reduz suas atividades no início da manhã e à noite. Mas nem todos podem se preservar da exposição prolongada a altas temperaturas ou dispõem de condições de refrigeração em suas casas. Há já 90 mortos na Índia e no Paquistão por stress térmico – no entanto, o que preocupa os exportadores da Índia é que a queda na safra de trigo arruinou os planos de aproveitar as condições de exportação resultantes da guerra contra a Ucrânia.

Neste ano, a onda de calor, com temperaturas que chegaram a 44ºC, atingiu na Índia as maiores temperaturas registradas em março nos últimos 122 anos. Em abril, em algumas regiões do país, quebrou todos os recordes. Um bilhão de pessoas na Índia e Paquistão, onde a temperatura chegou a 49ºC, estão ameaçadas pelo verão mais quente que esses países sofreram. Trata-se de uma onda de calor não acompanhada por chuva ou umidade.

O grupo de pesquisadores World Weather Attribution3 aponta que é a primeira vez que um evento climático como este abrange uma região tão grande. O efeito imediato na agricultura e na saúde pública já está sendo percebido, mas as consequências de desabastecimento de alimentos e queda dos salários em muitos ramos da economia serão observadas nos próximos meses. O rendimento das colheitas caiu 35% nas regiões mais afetadas. Também ocorreram inundações geradas pelo degelo inédito no Norte do Paquistão, e incêndios florestais na Índia.

A Índia está recorrendo ao carvão para produzir energia para sistemas de refrigeração4. O que, mesmo que diminua os efeitos cotidianos desta onda para quem possui ventiladores e aparelhos de ar condicionado em casa, ou para as empresas que garantem a continuidade da produção refrigerando os trabalhadores, continua contribuindo para a aceleração do aquecimento global.

Desde a era pré-industrial, a temperatura média mundial aumentou 1,2 graus centígrados. Arpita Mondal, do Instituto Indiano de Tecnologia5, alerta para a possibilidade de estas ondas se repetirem a cada cinco anos caso a temperatura média mundial aumente mais 0,8 graus centígrados, como se calcula para os próximos anos. Mas ainda não conseguimos calcular os efeitos desta onda. Na de 2010, na Índia, calculam-se 800 mortes causadas diretamente por stress térmico e 1300 mortes indiretas. A gravidade não está apenas nas altas temperaturas, mas na persistência delas.

Esses eventos, no entanto, não se restringem ao sul de Ásia. Em 2021, o Canadá alcançou temperaturas de 50ºC, que provocaram mais de cem mortes. Em 2018 e 2019, a Alemanha sofreu temperaturas acima de 40ºC. Os acordos internacionais, que pretendiam conter o aquecimento global (da era pré-industrial até agora) a 1,5ºC, agora simplesmente aumentam a margem para 2ºC. A aceleração da produção e circulação de mercadorias está na origem desse círculo vicioso que nos fez penetrar neste cone da catástrofe para a nossa e as demais espécies.

Referências

  1. Tamy é mestre em história pela UNAM
  2. Silvia é professora da Unesp e editora do Contrapoder
  3. https://www.worldweatherattribution.org/climate-change-made-devastating-early-heat-in-india-and-pakistan-30-times-more-likely/
  4. https://browsenews.es/la-sofocante-india-recurre-al-carbon-sobrecalentado-para-enfriar/
  5. https://www.technologyreview.es/s/14266/el-cambio-climatico-esta-empeorando-las-letales-olas-de-calor-de-la-india

Silvia Beatriz Adoue

Professora da Unesp e editora do Contrapoder

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