Partidos comunistas no novo século

Os partidos comunistas vivem uma séria crise neste novo século. Por isso, devemos debater e apresentar contribuições em busca da recuperação da proposta comunista. Dou apenas uma pequena contribuição que, espero, possa ser tema de debates construtivos. 

Comecemos questionando a proposta de que um partido comunista deve ser o guia da revolução. Não concordo com essa proposta, pois não existe “Partido Guia” e nenhum partido comunista tem monopólio da consciência de classe. A sociedade é complexa, talvez mais do que imaginávamos, e o capitalismo, como um camaleão que assume muitas cores para disfarçar seu ser, consegue muitas manobras para mudar e sair das crises. As esquerdas socialistas, por sua vez, muitas vezes têm dificuldades de ver com clareza essas mudanças. Para o combate contra o capitalismo, precisamos estar em diversas e diversificadas lutas, tarefa que não deve ser de um partido apenas, mas sim de tantos quantos se colocarem como anticapitalistas, socialistas e comunistas.

Consequentemente, não existe “vanguarda esclarecida”. As lideranças existem e são muito importantes. Têm seu papel de impulsionar os debates e as ações, mas não são infalíveis. Assim como os partidos, as lideranças devem aceitar divergências, debater, levar para a sociedade, para os/as trabalhadores/as, para a base, para a classe explorada pelo capital suas propostas e seus debates. Não devem se apegar a cargos e nem podem, como ocupantes de cargos, ter privilégios. Podem, e devem, em casos de necessidade, de tempo integral, ser remunerados pelo trabalho partidário, mas isso não pode se transformar em privilégio político.

Os partidos comunistas devem, logicamente, ter unidade de ação. Isso é condição em todos os partidos, mesmo nos da burguesia. Mas essa unidade não pode restringir a ação dos partidos junto àqueles que farão as transformações sociais. As massas, as classes exploradas, os/as trabalhadores/as (centralmente, pois são os/as explorados/as diretos pelo capitalismo) devem ser incentivados a participar dos partidos. Assim como dos movimentos sociais. Portanto, os partidos revolucionários devem ter as portas abertas para todos que concordarem que o capitalismo deve ser substituído pelo socialismo e pelo comunismo. Quanto mais de “massa” sejam, melhor! O “centralismo democrático” não deve ser um princípio aplicado automaticamente a todas as situações, mas apenas nas situações sociais em que seja exigido.

O que unificaria os partidos comunistas? O objetivo central deve ser a superação da sociedade de classes e da propriedade privada dos meios de produção, a revolução comunista, que pode se dar de diversos modos conforme esteja o nível de desenvolvimento das contradições e da consciência do/a trabalhador/a Claro que esses objetivos admitem análises de conjuntura, transição, flexibilidade. Não pode ser um “tudo ou nada”.

As reformas isoladas, a favor dos pobres ou dos trabalhadores, são muito bem-vindas, desde que não sejam um fim em si mesmas. Devem ser politizadas, a fim de mostrar que são apenas reformas para amenizar o mal que o sistema produz, mas que seu fim deve ser “outra sociedade”, uma sociedade que vá caminhando para o socialismo. Aliás, penso que o capitalismo não merece mais os créditos das “reformas”. Em seu lugar, devemos propor um “projeto amplo”, para além de “reformar o capitalismo” e ir pavimentando outra sociedade, a sociedade socialista/comunista.

Como conseguiríamos este intento ainda no capitalismo? Pela difusão de conselhos, movimentos sociais e sindicatos. Fora das organizações partidárias, devemos fortalecer essas organizações não partidárias, sem fugir da noção da totalidade, ou seja, da interligação de todas as lutas. E os partidos? Os partidos teriam o fundamental papel de “costurar” essas lutas, que, muitas vezes, aparecem artificialmente com um caráter bem diferenciado. Por exemplo, ocupações urbanas ou rurais, a luta antirracista ou de gênero, ou uma greve de bancários ou de professores: quem faria o importante papel de costurar a unidade antissistema dessas lutas? Quem as canalizaria e mostraria que é o capitalismo a CAUSA de todos esses problemas? Os partidos.  

Os partidos comunistas não devem priorizar a luta pela “democracia liberal”, “democracia burguesa” ou pelo “estado de direito capitalista”. É lógico que enquanto tivermos este sistema que oprime, explora e aliena o/a trabalhador/a, temos de usar todos os meios legais para apoiar suas lutas. Mas sempre olhando para a frente, sempre olhando para uma democracia que permita o florescer do socialismo. 

Temos de saber que o marxismo não é um conjunto de verdades reveladas. É um complexo que parte dos estudos de Marx e Engels, que mostraram como as contradições do capitalismo podem possibilitar a construção da sociedade comunista, mas que estas não cairão do céu e, assim, dependerá da organização de luta dos trabalhadores construir a nova sociedade do ventre das contradições da antiga. Essas contradições estão na sociedade derivadas das contradições do grande capital monopolista e da extração de mais-valia do trabalhador. Portanto, já estão presentes no dia a dia da sociedade. Por isso, a luta contra o capital, pelas políticas sociais e pelo controle operário, ainda no capitalismo, é fundamental.

Também devem defender as nossas revoluções do século passado, analisar o que pode ser aproveitado e criticar quando necessário. Sem esquecer que o mais importante é buscar analisar as atuais contradições do capital.

Por fim, os/as representantes parlamentares eleitos/as devem ter a noção do que são: representantes. Não podem se ver como sujeitos sociais privilegiados, acima dos demais, porque foram eleitos em eleições capitalistas. Devem estar em permanente contato com seus representados e, se não cumprirem com o que as bases desejarem, poderão perder o cargo.

Antonio Julio de Menezes Neto

Sociólogo e doutor em educação.

Um comentário sobre “Partidos comunistas no novo século

  • 23 de setembro de 2023 at 10:57 pm
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    Texto interessante mais muito primário ainda esta parecendo a fabula de Esopo quem vai colocar o sino no pescoço do gato… O Lula esses dias falou poucas e boas para o presidente dos Estados Unidos e foi ate a aplaudido, mas ate que ponto o capital vai abrir concessão para ideias comunistas, coesão sim, porque não temos no ar nenhum movimento organizado, para exigir e não pedir…
    Por enquanto não temos nenhuma saída
    Mas continue exercitando sua capacidade de oferecer ideias, mesmo que caia no campo de devaneios…

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