Professores na Linha de Tiro!

“Eu posso vê-los, vocês não podem… vocês não têm olhos que voam!” Assim Iasi (2019) encerra sua elegia aos jovens combativos que perderam seus olhos na luta contra o Estado e a selvageria capitalistas no Chile. Se nos irmanamos aos jovens chilenos e a tantos outros no planeta, se nos vemos refletidos em suas dores e em seus motivos inumeráveis para a rebelião, somos também obrigados a nos defrontarmos com nossos próprios fantasmas que, vivos, seguem nos assombrando. Se a alegoria dos “olhos cegos que voam” faz crescer a impossibilidade de vedar a consciência política naquele país e em muitos outros, no Brasil temos convivido com a infinita tristeza dos “olhos que pouco veem”, dos “olhos que não voam”. Todos os dias — inexoravelmente — somos abalroados por más notícias vindas de todos os quadrantes do país. Quase todas são dignas de levantes populares. Entretanto, num “berço pouco esplêndido” permanecemos deitados.

Análises políticas que pretendem explicar porque e como chegamos aqui (1) e inúmeras evidências das crueldades a que milhões de nós somos permanentemente submetidos inundam a imprensa crítica. Entretanto, as políticas federais que insidiosamente vêm atingindo a formação de professores não despertaram — ainda — nenhuma grita, seja na mídia, seja entre os profissionais e instituições que formam professores. Excetuadas as manifestações capitaneadas pela Anfope (ANFOPE ET AL, 2019) e seus intelectuais e alguns debates aqui e ali, nossos olhos seguem voltados ao chão.

Um “fato” e um “talvez fato” dessa semana, relativos ao Ministério da Educação, deveriam nos assustar pelos rumos que anunciam. O fato: o Ministro da Educação Antonio Paulo Vogel Medeiros, substituto de Abraham Weintraub, baixou a Portaria no. 2.167, de 19 de dezembro de 2019 (BRASIL, 2019a), por meio da qual homologa o Parecer CNE/CP no. 22, de 7 de novembro de 2019, e resolução anexa, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para as Educação Básica e Institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica — BNC-Formação (BRASIL, 2019b e c). O “talvez fato”: a mídia em geral tem desgastado Weintraub e apostado na sua queda ( 2). Atribui-se o seu afastamento do MEC à pressão de interesses privados na Educação.

1 Quanto ao “fato”

A atual rodada de decisões acerca da formação docente no país veio à tona no final do Governo Temer, quando se publicou a Proposta para Base Nacional Comum da Formação de Professores para a Educação Básica (BRASIL, 2018). Redigida sob o Ministério de Rossieli Soares da Silva, seus autores incluem importantes intelectuais orgânicos da burguesia, como Guiomar Namo de Mello e Fernando Luiz Abrucio (3). Depois de dormitar em alguma gaveta oficial, reapareceu no Governo Bolsonaro, seguindo-se a ela uma “terceira versão” do Parecer sobre Diretrizes Curriculares Nacionais e Base Nacional Comum para a Formação Inicial e Continuada de Professores da Educação Básica (BRASIL, 2019d), bastante colada à Proposta referida. Nem gastemos nosso tempo dizendo que tudo se passou nas entranhas governamentais sob a falácia das “consultas públicas” online.

Surgiram, diretamente articulados, dois outros documentos fundamentais de nosso ponto de vista: o Educação Já, produzido pelo Todos pela Educação (TPE) (2018) e o Future-se, apresentado pelo MEC (BRASIL, 2019e). Em texto anterior (EVANGELISTA, 2019), argumentamos que causava espécie a ausência da formação do magistério nacional no Future-se, posto que tal preparo deveria ser incumbência das instituições públicas de ensino, embora sua atuação nessa área, desde os anos 2000, venha sendo muito reduzida. A mesma ausência se verificava no Educação Já, assim como na Proposta e no Parecer. Parecia evidente que as licenciaturas não cabiam em instituições universitárias, devendo destinar-se a elas um “local específico”. Também argumentamos que essa exclusão respondia, quiçá, à dificuldade da área em apresentar produtos comercializáveis em larga escala. É claro que a portaria baixada pelo Ministro Substituto não altera o processo que vinha ocorrendo e não apresenta novidades, a não ser que agora a BNC-Formação está sacramentada pelo MEC.

Onde o fato se encontra com o “talvez fato”? Precisamente na confluência dos interesses privados que a formação docente e seu espectro concretiza como “bem mercadejável” (GRANEMANN, 2007): material didático, softwares educativos, consultorias, soluções digitais, portais, sistemas de ensino, cursos de extensão, tecnologias, bolsas, seguros, matrículas, Educação a Distância (EaD) e que tais. Ganhar o MEC, ganhar a Educação pública, ganhar a formação docente é aceder a um nicho de mercado gigante e em expansão para várias frentes da Educação Básica. Todos os flancos serão atacados!

No fato o Todos pela Educação tem presença recorrente tanto na redação da Proposta para Base Nacional Comum — Mello é Associada Efetiva do TPE e Abrucio membro do Conselho de Governança –, quanto na Comissão Bicameral que redigiu a terceira versão do Parecer. Neste segundo caso, interessa saber quem participou do banquete no qual os trabalhadores são as iguarias servidas à mesa, cuja toalha está marcada pelo novel slogan do Conselho Nacional de Educação, “professores, engajem-se”!, brocardo indicativo de que os problemas docentes a eles pertencem! Se cabe aos professores individualmente resolver suas questões, a proposição do Parecer não foi nada individual… Seus 10 componentes agiram em uníssono (4), lastreados nos interesses de classe burguesa que os unificam, escondidos sob bandeiras edulcoradas para o senso comum: “demandas educacionais contemporâneas” derivadas “de uma sociedade cada vez mais complexa” exigem mudanças. É preciso focar nas “aprendizagens essenciais” de modo a que a Educação Básica desenvolva “competências profissionais” no futuro professor e por tabela nos seus alunos. A “Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU)” (ONU, 2016) conclama os brasileiros à sua concretização. Pobre professor!

Mais do que às pessoas — embora esse seja um indício importante –, é necessário voltar nossa atenção às instituições das quais os 10 conselheiros fazem parte e como se movimentam nas esferas pública e privada, como trocam informações privilegiadas, como cambiam posições políticas e concretizam interesses econômicos. O arco de suas relações institucionais é vastíssimo e vem dos anos de Fernando Henrique Cardoso, incluindo Aparelhos Privados de Hegemonia (APH); instituições de ensino superior privado; Aparelhos de Estado; empresas educacionais de capital aberto; Sistema S; movimentos empresariais e Organização Social (OS). Instituições menores aparecem talvez para legitimar a negociata da formação humana no Brasil.

Ressalta entre os APHs, os movimentos empresariais organizados no TPE e no Movimento pela Base (MPB), dos quais participam pelo menos sete conselheiros, entre eles a Presidente da Comissão, Maria Helena Castro. Castro manteve relações com organismos multilaterais, caso da OCDE. O presidente do CNE, Luiz Roberto Liza Curi, além dos vínculos com o aparelho de Estado, fundou a Estácio de Sá, empresa educacional de capital aberto, é sócio proprietário da Faculdade Unyleya/EaD, holding que oferece apenas a modalidade a distância e tem relações com a Pearson (EVANGELISTA; FIERA; TITTON, 2019). Além disso, implementou o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), Organização Social, uma das cotadas para assumir o novo modelo de Universidade proposto pelo Future-se. Refira-se também a Kroton, hoje Cogna Educação, e a Ser Educacional, que se configuram como empresas educacionais de capital aberto, expondo o comprometimento da fração financeira da burguesia no preparo do professor como elo entre o capital e o trabalhador por ele demandado. Tal conglomerado deixa cristalinos os lobbies no interior do Aparelho de Estado; mais que isso, são sujeitos com demandas expressas de classe, nomeados pelo próprio Estado. A organização dos interesses do capital de ensino superior e dos interesses burgueses na Educação pública é irretorquível!

A situação a que chegamos no que tange à formação docente é gravíssima e poderá piorar. Após os anos de 2000, cresceram exponencialmente as Instituições de Ensino Superior (IES) privadas no país, resultado da indução do poder público. Além de abrir mão da responsabilidade pela formação docente, possibilitou por vários artifícios a punção dos seus fundos, inclusive pelas políticas do FIES e do ProUni. Dados de 2018 demonstram a concentração não refreada de matrículas em graduação no setor particular, com fins lucrativos: 50,2% (4.241.339). Se considerarmos todas as IES privadas (com e sem fins lucrativos), 75,4% (6.373.913) das matrículas estavam nelas. No caso das licenciaturas, foi entre 2003 e 2018 que as matrículas foram sugadas pelas IES particulares, especialmente na EaD. O curso de Pedagogia ostenta cifras escandalosas: em 2018, contava com 747.511 (45,9%) das 1.628.676 matrículas em licenciaturas. 473.607 (63%) delas estavam em IES particulares, sendo 369.028 (49%) na EaD. É assustador vermos que 82,5% (616.393) dos jovens estão matriculados nas escolas privadas.

Junta-se ao fenômeno da privatização da formação docente — e por decorrência, a da formação da classe trabalhadora — o problema da restrição teórica, pois a EaD foi a forma pela qual os custos da formação juvenil foram racionalizados. Claro que esse processo tem várias faces: trata-se de uma formação precária, com trabalhadores docentes precarizados nas IES privadas, com jovens endividados pelo sistema de bolsas e seguros, com desemprego no horizonte mas com apropriação de fundos públicos e exploração do trabalho associados à venda de certificados em larga escala. Tragédia que se aprofundará. O crescimento das matrículas nas IES particulares foi imenso: em 2011 eram 180.808; em 2015, 350.032; em 2018, 593.375. No caso das IES privadas, em 2018, o percentual de formandos em EaD nas licenciaturas correspondeu 105.080 ou 42%; nas escolas públicas, somados os cursos presenciais e EaD foi menor (64.876 e 12.303 respectivamente). Lidera esse movimento o grupo Kroton (Cogna) que detinha, em 2015, 17% do total de 25,1% de matrículas dominadas pelas quatro maiores escolas particulares no Brasil.

Resta pouco a dizer… a formação humana não é o objetivo deste conjunto de instituições, organizações, aparelho de Estado e seus prepostos. O intuito não declarado e mesmo obscurecido é o da formação da classe trabalhadora, sua docilização, seu apassivamento. Demier assinala que além da necessária “ampliação do exército industrial de reserva, da ‘superpopulação relativa’ de Marx”, é preciso “a formação de uma massa de trabalhadores cujos empregos não venham mais acompanhados de quaisquer garantias mínimas de sobrevivência.” Nisto querem tornar os professores: instrumentos de interesses burgueses, transformados eles próprios nos trabalhadores acima referidos. Não nos enganemos.

Nesse âmbito, o “talvez fato” emerge como indagação: se Weintraub cair melhora alguma coisa para a formação docente e a Educação pública? Lamentavelmente, não, dado que é na confluência entre interesses privados e formação docente que vemos se concretizar a Educação como “bem mercadejável” (GRANEMANN, 2007).

2 Quanto ao talvez fato

Como dito, a queda do Ministro da Educação não virá em nosso favor. Penso ter ficado claro que a hegemonia de Aparelhos Privados burgueses no interior do Aparelho de Estado e da Sociedade Civil pauta o sentido das políticas educacionais. Tal hegemonia investe em políticas diretamente ligadas à consecução de seus interesses, assim como naquelas que os viabilizam. A formação da força de trabalho não prescinde da escola, nem da ação docente, exigindo da classe dominante renovadas medidas para a produção e reprodução de seus interesses no seu interior, afastando progressivamente os valores e conhecimentos universais que deveriam orientar a formação humana — mas nós, seu anátema, estamos lá para nos contrapormos ao seu projeto histórico.

Sem Weintraub veremos, provavelmente, tomar conta do MEC, de forma ainda mais arrasadora, os defensores dos interesses privados, seja os ligados ao Ensino Superior, seja os ligados à Educação Básica, articulado aos quais se encontra a formação docente. Fontes (2018) (5) chama a atenção para o fortalecimento da organização da intervenção burguesa sob a forma de Aparelhos Privados de Hegemonia ou Aparelhos de Ação Política tendo em vista a reposição e manutenção de suas condições de dominação e a execução de seu projeto histórico. O que está em jogo é, pois, a produção e reprodução das condições sociais de apropriação e exploração do trabalhador para a acumulação de capital no âmbito do projeto ultraliberal, desiderato que se reveste aparencialmente de proposições universais.

Ao examinarmos as organizações e empresas vinculadas aos conselheiros que compuseram a fatídica Câmera Bicameral vemos suas ligações com o capital que domina o Ensino Superior no Brasil. Lá estão: a Associação Nacional dasUniversidades Particulares (ANUP), cuja presidente, Elizabeth Guedes (6), é irmã do Ministro da Economia Paulo Guedes; a Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES); o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Pará (SINEPE/PA); o Fórum dasEntidadesRepresentativas doEnsino Superior Particular (Fórum); a Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino Superior Particular (Funadesp) e oSindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo/Centro Brasileiro de Desenvolvimento do Ensino Superior (Semesp/CEBRADE); a Kroton (Cogna); a Ser Educacional; a Estácio de Sá. É de se mencionar, ainda, a presença da Pearson, ‘a empresa de aprendizagem do mundo’, que oferta Educação Básica, soluções digitais e livros para o Ensino Superior. Ao lado dela, encontramos laços com a OCDE, OEA e Unesco, levantando a problemática, velha já, da ação internacional sobre os conteúdos da formação humana no Brasil.

Não resta dúvida quanto à existência de potentesmecanismos de pressãono Conselho Nacional de Educação, bem como entre os Aparelhos de Hegemonia que o compõem. Esta Comissão mostra como funcionam as frações burguesas organizadas (locais e internacionais) e como procedem seus intelectuais orgânicos quando se trata não apenas de abocanhar uma larga fatia do “mercado educacional”, mas de assegurar o sentido das mentes de professores e trabalhadores.

O avanço do capital sobre o Ensino Superior redundou na “financeirização da formação docente”, designação talvez inadequada, acobertada pelas políticas de democratização do acesso ao ensino superior. Contudo, a certificação em larga escala, organizada pelas grandes escolas particulares, foi oferecida majoritariamente na forma de licenciaturas e em EaD. O jovem aspirante ao ensino superior viu-se na contingência de pagar pelos estudos, mas principalmente por aqueles que lhes dariam a docência como possível futuro. Enquanto isso, às expensas de seu fundo de vida e de seu endividamento, suas matrículas eram negociadas na bolsa de valores, fato que tem início entre 2006 e 2007. Nesta situação, passível de erupção, a burguesia tirou da cartola — junto com o Banco Mundial, a Unesco e a OCDE — as “competências socioemocionais”, entre as quais ressalta-se sobejamente a resiliência emocional (BARRETO, 2018).

Entre as organizações presentes no CNE, o TPE desponta como crucial e vem sendo estudado por muitos pesquisadores, há muitos anos, e seu crescimento, desde 2006, é notável. É esse mesmo TPE que vem jogando contra Weintraub — e já o fez contra Vélez. Não raro seus intelectuais vêm à imprensa tecer críticas à política educacional — e elas são muito criticáveis, mas as fazemos por motivos diferentes e do ponto de vista da classe trabalhadora para quem a escola pública deveria ser um direito inalienável. Até o momento essa crítica não levou o TPE à cabeça do Ministério, mas seu projeto político está lá, muito bem assentado e talvez, finalmente, se consolide caso represente a variedade de interesses presentes. Há polêmicas acerca disso.

O TPE é hoje uma ‘força aglutinadora de forças’ a não ser desprezada. Basta dizer que João Paulo Lemann aposta nele muitas fichas por meio da Fundação Lemann (FL), entidade sem fins lucrativos (além dessa, Lemann é dono da Fundação Estudar, Lemann Center e Gera Venture Capital). Atualmente, é secretária executiva do Movimento Pela Base (MPB), que articulou e aprovou a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a Educação Básica (7). Desde 2015, é proprietário da Revista Nova Escola, quando criou a Associação Nova Escola (ANE), start-up de educação, única instituição do gênero presente nas audiências públicas do Conselho Nacional de Educação para discussão da BNCC. A ramificação de Lemann vai longe e sua atuação corre na direção contrária à formação científica dos professores.

A composição do TPE (8), bem conhecida, não deixa lugar a dúvidas, embora não saibamos com clareza co)mo as negociações no MEC correrão; a pauta do Future-se está aberta, mas a da formação praticamente se fechou, faltando esclarecer onde e como o professor será efetivamente formado (9), dado que a resolução é escapista:

Art. 8º. Deve ser garantido ambiente organizacional que promova a articulação entre as ofertas de licenciaturas e demais cursos e programas destinados à formação docente, por meio de institucionalização de unidades integradas destinadas à formação de professores, de forma a garantir a integração entre docentes da instituição formadora e professores das redes de ensino, promovendo uma ponte orgânica entre a Educação Superior e a Educação Básica (BRASIL, 2019c).

3 E assim vamos

Assim, pois, caminhamos para o fim de 2019, um ano em que a Educação pública sofreu terríveis golpes. O capital educador,com lente potente, esquadrinhou o campo e parece ter encontrado todas as possibilidades para o exercício de sua crueldade. Despejou sua insanidade sobre as escolas públicas de todos os níveis, os professores, os alunos. Não se desviou nenhum momento de seu projeto histórico destrutivo e desumano. Está no centro do problema o modo pelo qual o projeto histórico burguês se repõe e simultaneamente repõe o projeto de vida dos trabalhadores. A conclusão de Demier (2019) é profunda: os “trabalhadores e trabalhadoras têm que estar não só ‘livres como pássaros’ (Marx) para se disponibilizem ao capital, mas devem também, sob o ultraneoliberalismo, estar famélicos e com suas asas quebradas, de modo que qualquer moeda capaz de ser trocada por curativos e alpiste no mercado seja vista como uma graça divina. Todos têm que estar sem nada para que possam aceitar tudo.”

Esse é o horizonte anunciado, e em andamento, no projeto de formação docente aprovado pelo CNE e MEC; esse é o projeto de formação da classe trabalhadora brasileira. Como faremos frente a essa dramática devastação?

1 — Veja-se, por exemplo, a entrevista de Ruy Braga a Gabriel Brito no Correio da Cidadania, em 20 de dezembro de 2019 (BRITO, 2019).

2 — É o caso da capa de Carta Capital, edição 1.086, cuja manchete é: “Na porta da rua. Weintraub está com a cabeça a prêmio não por suas patacoadas, mas pela força dos interesses privados na Educação”. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/.

3 — Guiomar Namo de Mello: Professora universitária na PUC-SP (1967–1985); Pesquisadora no Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas (1971–1982); Secretária da Educação da cidade de São Paulo (1982–1985); Deputada Estadual por SP (1986); Assessora do Senador Mario Covas na Constituinte; contribuiu para a formação do PSDB (1988); consultora de projetos de investimento em educação do Banco Mundial no Nordeste e em Minas Gerais (1990–1991); Especialista Sênior de Educação no Banco Mundial e no Banco Interamericano de Desenvolvimento (1992–1996); Diretora Executiva da Fundação Victor Civita e Editorial da revista Nova Escola (1997–1995); nomeada Conselheira do Conselho Nacional de Educação-Câmara de Educação Básica (1997); Relatora do Parecer das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio; participou da elaboração das Diretrizes Curriculares da Educação Profissional e da elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação de Professores da Educação Básica em Nível Superior; consultora da SEMTEC/MEC para implementação da reforma curricular do Ensino Médio (1998–2000); (2000–2004) participou da educação à distância de professores no Curso Normal Superior da Uniararas; participou da educação à distância de professores na Escola de Professores do Ensino Médio; participou da educação à distância no Curso de Formação de Professores por Mídias Interativas da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Paraná; atual diretora executiva da Fundação Victor Civita; diretora da Escola Brasileira de Professores, em São Paulo; associada efetiva do TPE. Fernando Luiz Abrucio: professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (SP) (1995-); colunista político do Jornal Valor Econômico S/A (2000–2006); colunista da Revista Época (2007–2013); apresentador do Programa Discuta, São Paulo, na rádio CBN; Secretário Adjunto da Associação Brasileira de Ciência Política (2001–2002); atual presidente da Associação Nacional de Ensino e Pesquisa do Campo de Pública (ANEPCP); membro do Conselho de Governança do TPE, junto com Mozart Neves Ramos, um dos cotados para o MEC.

4 — O Parecer foi elaborado por uma Comissão Bicameral, Portaria CNE/CP N° 10, de 08 de abril de 2019 (BRASIL, 2019f), composta por: Maria Helena G. Castro (CEB/CNE) — Presidente; Mozart N. Ramos (CEB/CNE) — Relator; Alessio C. Lima (CEB/CNE); Antonio C. Netto (CES/CNE); Aurina O. Santana (CEB/CNE); Ivan C. P. Siqueira (CEB/CNE); Luiz R. L. Curi (CES/CNE); Marília A. Lopez (CES/CNE); Nilma S. Fontanive (CEB/CNE) e Suely M. de C. Menezes (CEB/CNE). Participaram de algumas reuniões: Ministério da Educação (MEC); Conselho Nacional de Secretários da Educação Básica (Consed); União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime); Conselhos Estaduais e Municipais de Educação; segmentos do Ensino Superior público e privado; entidades vinculadas à área de Educação (como Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação — ANPEd e Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação — Anfope); Organizações Científicas (como Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência — SBPC e Academia Brasileira de Ciência — ABC); setores da sociedade civil (como os Movimentos Todos pela Educação Profissão Docente).

5 — Fontes (2018) avalia que o novo associativismo empresarial é “[…] algo como uma ‘nova direita’ associativa, com ações voltadas para a organização de setores das classes dominantes e para a definição de pautas centrais, setoriais ou do conjunto da classe, para a atuação parlamentar e governamental. […] A dimensão dos aparelhos privados de hegemonia, da qual fazem parte também partidos, sindicatos, mídia, escolas, clubes etc., segundo a conceituação gramsciana — é espaço no qual se exercita a sociabilidade e onde se travam as grandes batalhas pela compreensão do mundo, pela consciência e pelas opções e possibilidades existentes de sua conservação ou transformação.”

6 — Notícia na página da ANUP (2019) indica que “Na última quarta-feira, 4, a presidente da ANUP, professora Elizabeth Guedes, proferiu palestra no Conselho Nacional de Educação sobre ‘Os riscos e as oportunidades da autorregulação da educação superior brasileira’. A ANUP foi convidada pelo presidente da Câmara de Ensino Superior, Antônio Araújo Freitas, para fazer um apresentação do tema para os membros do conselho”.

7 — No Governo Temer, em dezembro de 2017, aprovou-se a BNCC para a Educação Infantil e Ensino Fundamental (BRASIL, 2017). Do ponto de vista oficial, participaram do MPB Ministério da Educação, Conselho Nacional de Secretários de Educação e União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação. Do ponto de vista empresarial, participaram Fundação Lemann, Fundação Roberto Marinho, Instituto Unibanco, Instituto Natura, Instituto Inspirare, Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal. Ainda participaram Associação Brasileira de Avaliação Educacional, Comunidade Educativa e Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. Destacou-se o TPE, inclusive Rede Globo, Itaú Social, Bradesco, Gol, Instituto Votorantim e outros.

8 — Dele fazem parte institutos e fundações empresariais, grupos, empresas, intelectuais, entre os quais constam Fundação Bradesco, Itaú Social, Fundação Vale, Fundação Telefônica/Vivo, Instituto Natura, Instituto Península, Instituto Unibanco, Itaú BBA, Milú Vilela, Prisma Capital, Burger King, Editora Moderna, Fundação Educar, Educar DPaschoal, Fundação Roberto Marinho, Instituto Votorantim, Suzano, Gol, entre outros. Suas organizações são ligadas a empresários de vários ramos e a instituições financeiras.

9 — Na 3ª Versão do Parecer, entre as linhas 886 e 899 do documento referido lê-se: “Para que esses marcos se efetivem é preciso dar aos cursos de licenciaturas o lugar de importância que hoje eles não têm nas Instituições de Ensino Superior, especialmente porque ficam numa posição menor se comparados aos cursos de Bacharelado — falta identidade às licenciaturas. Em muitos casos, os cursos de licenciaturas são constituídos por um conjunto de disciplinas do Bacharelado correspondente e mais um pequeno conjunto de disciplinas teóricas da área da Educação, sem nenhuma conexão entre eles e com a prática escolar. Portanto, a construção deste parecer relativo à formação docente tem procurado apontar caminhos que possam efetivamente superar as dicotomias entre teoria e prática, entre escola e universidade, promovendo de fato um currículo que supere a atual fragmentação e a ausência de articulação entre os diferentes saberes. Isso exige dar as licenciaturas identidade própria, num ambiente institucional que promovam a implementação de tais marcos. Um dos caminhos poderia se dar por meio da institucionalização de institutos de formação de professores, apoiados mediante programas de editais e que teriam, em sua composição, além de docentes da IES formadora, professores das redes de ensino, promovendo uma ponte orgânica entre o ensino superior e a educação básica (BRASIL. CNE, 2019b, grifos no original).

Referências

ANFOPE et al. Contra a descaracterização da formação de professores. Disponível em: https://formacaoprofessordotcom.files.wordpress.com/2019/10/nota-entidades-bncf-outubro2019.pdf. Acesso em: 23 dez. 2019.

ANUP. Presidente da ANUP debate autorregulação no Conselho Nacional de Educação. Disponível em: https://anup.org.br/noticias/presidente-da-anup-debate-autorregulacao-no-conselho-nacional-de-educacao/. Acesso em: 22 dezembro 2019.

BARRETO, Daniela. Competências para o progresso social. O poder das competências socioemocionais. OCDE, [S.l], 14 de março de 2018. Disponível em: <https://bit.ly/2RmHrFi>. Acesso em: 10 out. 2018.

BRASIL. Resolução CNE/CP nº 2, de 22 de dezembro de 2017. Institui e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular, a ser respeitada obrigatoriamente ao longo das etapas e respectivas modalidades no âmbito da Educação Básica. Diário Oficial da União. Seção 1. Brasília, DF, 22 dez. 2017.

BRASIL. CNE. 3ª Versão do Parecer (atualizada em 18/09/19). Diretrizes Curriculares Nacionais e Base Nacional Comum para a Formação Inicial e Continuada de Professores da Educação Básica. 2019d.

BRASIL. CNE. Portaria CNE/CP n°10, de 8 de abril de 2019. Recompor a Comissão Bicameral de formação inicial e continuada de professores com o objetivo de acompanhar, monitorar, orientar e apoiar a implementação de diretrizes curriculares nacionais, por meio de ações articuladas entre o CNE, o Ministério da Educação, as Instituições Ensino Superior, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), as entidades de campo, as Secretarias de Educação (seus sistemas e redes), visando a consolidação de política nacional de formação dos profissionais da educação, bem como promover a revisão das licenciaturas de formação de professores. Indicações CP 3/2002, CP 1/2006 e CP 1/2007. 2019f.

BRASIL. MEC. Projeto de Lei nº… , de… de… de 2019. 2019e. Institui o Programa Institutos e Universidades Empreendedoras e Inovadoras — FUTURE-SE, e dá outras providências. Brasília, DF, 2019.

BRASIL. Parecer CNE/CP no. 22, de 7 de novembro de 2019. 2019b.

BRASIL. Portaria no. 2.167, de 19 de dezembro de 2019. 2019a.

BRASIL. Proposta para Base Nacional Comum da Formação de Professores para a Educação Básica.2018.

BRASIL. CNE. Projeto de Resolução CNE/CP n. XXX/2019. Diretrizes Curriculares para Formação Inicial de Professores da Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). 2019c.

BRITO, Gabriel. 2019: o silêncio que precede a explosão. “Estamos num barril de pólvora”. Correio da Cidadania. Disponível em: http://www.correiocidadania.com.br/34-artigos/manchete/13989-2019-o-silencio-que-precede-a-explosao-estamos-num-barril-de-polvora. Acesso em: 21 dez. 2019.

DEMIER, Felipe. ‘Livres como pássaros’ e mortos como insetos: a classe trabalhadora e a juventude periférica sob o bolsonarismo. Esquerda online. Disponível em: https://esquerdaonline.com.br/2019/12/21/livres-como-passaros-e-mortos-como-insetos-a-classe-trabalhadora-e-a-juventude-periferica-sob-bolsonarismo/. Acesso em: 21 dez. 2019.

EVANGELISTA, Olinda. Por que o Future-se abjurou a formação docente?Universidade à esquerda.Disponível em: http://universidadeaesquerda.com.br/debate-por-que-o-future-se-abjurou-a-formacao-docente/. Acesso em: 30 set. 2019.

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GRANEMANN, Sara. Políticas sociais e financeirização dos direitos do trabalho. Em Pauta, no 20. Rio de Janeiro: UERJ, 2007, p. 57–68.

IASI, Mauro L. Os olhos do Chile. Blog da Boitempo. Disponível em: https://blogdaboitempo.com.br/2019/12/02/os-olhos-do-chile/. Acesso em: 21 dez. 2019.

ONU. BRASIL. Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. 2016. Disponível em: <https://www.undp.org/content/dam/brazil/docs/agenda2030/undp-br-Agenda2030-completo-pt-br-2016.pdf>. Acesso em: 29 jul. 2019.

TODOS PELA EDUCAÇÃO. Educação Já! Uma proposta suprapartidária de estratégia para a educação básica brasileira e prioridades para 2019–2022. Versão para debate. 3ª edição novembro/2018.

Olinda Evangelista

Professora, pesquisadora de políticas públicas em educação e formação docente, bordadeira.

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