Quem espera nunca alcança: Impeachment já!

O que estamos vivendo demonstra uma crise grave que vinha se desenvolvendo em diversas dimensões da vida: a) uma dimensão econômica que piora a vida do povo a cada ação governamental em defesa dos lucros e em detrimento dos direitos dos trabalhadores; b) uma dimensão política, que revela que os partidos tradicionais da velha esquerda e da direita de sempre nada tem de novo a propor frente aos povos que não se vêem representados em seus governos; c) uma dimensão ambiental, na qual a natureza vem sendo destruída sem precedentes, sem nenhum sinal de que os grandes bilionários dêem um passo atrás em sua ganância para salvar o planeta.

A entrada da pandemia do Coronavírus, com todo sofrimento que traz ao nosso povo, revela o que há de mais perverso no sistema capitalista, provoca um salto na crise multidimensional. Os governos de joelhos ao capital, neste momento, vivem um dilema antiético: devemos salvar a economia ou a saúde do povo? Para nós, anticapitalistas, este é um falso dilema.

Os economistas inteligentes, que não previram a crise de 2008, aprenderam com ela. Gritam agora: Somos todos keynesianos! Até a próxima oportunidade de saquear o Estado novamente. Sabem que a contração econômica é inevitável e atuam para apagar um incêndio por dia. O Bank of America aponta uma contração de 3,5% no PIB de 2020. É provável que seja mais. O banco afirma que, entre os países da América Latina, o Brasil é um dos mais sensíveis ao preço das commodities (em queda há meses, acompanhando a retração forte na demanda global) e ao mercado chinês, maior parceiro comercial brasileiro. 

O governo Bolsonaro, como todos sabemos, tem em seu núcleo econômico, pessoas que têm o lucro como religião, assim como a grande maioria dos governos, mas com uma particularidade, uma vinculação a frações burguesas mais radicalmente liberais e pró-imperialistas, justamente por sua condição subordinada e dependente. Seria interessante pensar como Bukhárin o fez com os financistas, a psicologia social do burguês de um país dependente. Com o perdão da metáfora, caíram as máscaras de Roberto Justus, do véio da Havan ou o dono do Madero e outros burgueses dependentes da demanda doméstica, amigos íntimos de Paulo Guedes e financiadores da campanha de Bolsonaro. Disseram literalmente que para eles não importa se vão morrer 5, 10 ou 20mil pessoas, desde que seus negócios sigam a pleno vapor. Sincericídio que não foi cometido por nenhum latifundiário do Agro.

Estas declarações revelaram algo que está na natureza de sua condição material, uma antiética do capitalismo. Trata-se da incongruência mais profunda que o sistema convive: entre booms e crises, vem à tona a contradição entre a produção social e apropriação privada da riqueza. A crise que estamos vivendo revela isso, sem que se precise (nem deva) sair de casa. O Estado, que nunca tinha dinheiro, derrama recursos na sociedade para ajudar a salvá-la, sempre, por óbvio, com prioridade para os banqueiros.

Dinheiro tem de sobra, a crise revelou. Também revelou de onde ele brota, flagrantemente, do trabalho! Magicamente salta aos olhos dos burgueses duas coisas que os de baixo aprendem pela pele: quando não se tem para quem vender, você quebra, no caso da força de trabalho, você sofre; quando você privatiza os serviços públicos de saúde, você morre, e nesse caso não há critérios de classe. Nesses momentos, os que bradavam pelo Estado Mínimo, mendigam Estado. Os louros das aventuras de Robinson Crusoe e seu ímpeto empreendendor, tão venerada pelos liberais, fica mais parecendo um episódio de Largados e Pelados. O que é coletivo, impera na necessidade. Ser realmente livre é ter consciência disso e é tudo o que eles não têm. 

O discurso insano e criminoso do presidente deixa nítido as preocupações dessa gente. Bolsonaro decidiu liderar seus apoiadores fanáticos de extrema-direita, não liderar o Brasil. Com isso perdeu a direção de seu governo, se enfrentou ao mesmo tempo com o Congresso, com os governadores, com o judiciário e, pasmem, inclusive com os generais. Perdeu protagonismo político para o ministro da Saúde, que segue a OMS, e mal. Seu negacionismo radical o isola, mas prejudica a todos enquanto estiver no poder. A cloroquina é seu novo nióbio, uma promessa sem certezas, um risco sem cálculos. Mas também nesta crise a ciência tem triunfado sobre as crenças. O messianismo que promete os céus, não sabe lidar com a terra em transe.

Mas nós que acreditamos que o lucro não pode estar acima da vida, temos uma obrigação histórica com nosso povo e com a verdade, que via de regra, é revolucionária. Não podemos ver um governo ameaçando a vida dos brasileiros em nome de salvar seus financiadores de campanha e uma burguesia tacanha que se utiliza de uma pandemia para retirar ainda mais direitos e empregos dos trabalhadores.

Quando decidimos com Fernanda Melchionna, Sâmia Bonfim e David Miranda, em conjunto com centenas de artistas, cientistas, lideranças políticas e intelectuais, entrar com um pedido de impeachment contra Bolsonaro, não foi por vaidade, nem prestígio. Acreditávamos que era necessário dar um sinal político para os panelaços e a indignação popular que cada vez mais crescem.

Não à toa, temos mais de 1milhão de assinaturas de apoio à inciativa. Intelectuais como Valdimir Safatle, Rosana Pinheiro Machado, Silvio Almeida, Alvaro Bianchi e Ruy Braga; artistas como Gregório Duvivier, Maria Rita, Carlos Latuff, Felipe Neto e Zélia Duncan; cientistas do calibre de Sidarta Ribeiro e Stevens Kastrup Rehen jamais entrariam em uma aventura prestigista. Fizemos por uma necessidade. A necessidade que setores mais conscientes da sociedade civil tinham de agir. Certamente faltaram muitos, queremos que todos se somem. Mas certamente não sobrou ninguém.

Como sabemos, a realidade não muda naturalmente, ela precisa ser confrontada. Quem espera nunca alcança e devagar é que não se vai longe, como cantou Chico Buarque. Voltar à normalidade, como disse Bolsonaro, vai significar a morte. Entramos com muitas propostas no parlamento para garantir a saúde dos trabalhadores da saúde, para garantir uma renda básica universal aos que precisam trabalhar, mas não é suficiente, precisamos apontar um caminho também no terreno da política. O povo pobre não pode escolher entre morrer de fome ou de Coronavírus. O Brasil tem que parar hoje para não morrer amanhã.

Agora, que as coisas se tornam ainda mais graves precisamos urgentemente parar Bolsonaro. A história não nos pedirá duas vezes. Impeachment Já!

Bernardo Corrêa

Atual presidente do PSOL RS, sociólogo e doutorando na UNB

6 comentários sobre “Quem espera nunca alcança: Impeachment já!

  • 10 de abril de 2020 at 5:06 pm
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    Impedimento já!!!
    Texto bem esclarecedor.
    #tamojunto

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  • 11 de abril de 2020 at 12:44 pm
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    Qual seria o fundamento jurídico do Impeachment? Não há. Vcs de esquerda simplesmente não aceitam que agora é a direita quem está no poder. Parecem mimados querendo o poder com discurso pseudo intelectual.

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    • 11 de abril de 2020 at 4:07 pm
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      Temos inúmeros argumentos, os crimes de responsabilidade, as relações com as milicias, os funcionários fantasmas… há bastante coisa.

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      • 11 de abril de 2020 at 5:45 pm
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        Por muito menos, já vi Presidentes darem o fora do poder. Este homem é um genocida e tudo o que foi exposto.
        Além de ser tão cínico que não respeita nenhuma Instituição.

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    • 12 de abril de 2020 at 10:12 am
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      Carlos Eduardo posso lhe passar a peça jurídica se vc quiser desde que sua dúvida seja sincera e não retórica. Da minha parte, não quero pagar de peseudo intelectual de esquerda, como você diz, só espero que você não queira pagar de peseudo advogado de direita para justificar o governo da estupidez.

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