Enquanto o litoral nordestino é atingido por gigantescas manchas de petróleo — um dos maiores desastres ecológicos da história brasileira -, sem que o governo federal tome qualquer providência efetiva para descobrir as causas do problema e mitigar seus efeitos catastróficos sobre o meio ambiente, Bolsonaro dedica-se de corpo e alma à guerra pelo controle do PSL. A rivalidade entre os antigos aliados não envolve divergência política ou ideológica. Bivar e Bolsonaro são farinha do mesmo saco.
A briga fratricida que dilacera o PSL gira em torno do controle de um fundo partidário de cerca de R$ 110 milhões. Os envolvidos não tiveram o menor pudor de manter as aparências, são interesses espúrios contra interesses espúrios. A “nova política” explicita-se como ela é — a “velha política”, reciclada para servir aos novos imperativos do neoliberalismo selvagem, sem qualquer tipo de biombo.
O prejuízo para a imagem de um personagem que se apresentou como novidade moralizadora da vida pública é irreversível. Os efeitos deletérios sobre a base de sustentação parlamentar de Bolsonaro serão imediatos. A acelerada desmoralização dos novos ocupantes do Planalto levará ao paroxismo a crise de legitimidade que corrói o sistema político.
Paradoxalmente, a extrema fragilidade do governo Bolsonaro e o impacto catastrófico de suas decisões sobre a vida nacional não colocam em questão sua continuidade como cabeça do Executivo Federal. Como na política não existe vácuo, na ausência de alternativa não há mudança possível. A esterilidade de uma oposição política perfeitamente enquadrada nos parâmetros da ordem assegura a Bolsonaro vida longa.
No momento, não há luz no fim do túnel. De olho no calendário eleitoral, o PT, com o apoio incondicional de seus partidos-satélite, é cúmplice do descalabro nacional. Lula Livre como centro da disputa política não leva a lugar nenhum. Sem mobilizar os trabalhadores, a oposição que faz vista grossa à reforma de previdência, que não combate o desmanche da política ambiental, que aceita a privatização do patrimônio público, que não se insubordina contra o desmanche das políticas públicas e que faz uma luta protocolar contra os ataques aos direitos dos trabalhadores corrobora a ofensiva avassaladora do capital sobre o trabalho.
Apostar todas as fichas na sangria do presidente miliciano, enquanto o país afunda na barbárie social e ambiental, é uma irresponsabilidade histórica. A polarização binária entre Bolsonaro e Lula é funcional à preservação do status quo. O medo e a ilusão, de um lado, a violência e a cooptação, de outro, articulam-se como estratagemas complementares para evitar a emergência das classes subalternas como sujeitos políticos. É o que se pretende cristalizar no precário “acordão nacional” que deve ser sancionado pelo STF nas próximas semanas.
Sem um programa que coloque na agenda nacional a urgência de transformações econômicas, sociais e políticas de grande envergadura, a oposição sanciona a agenda liberal. A abertura de novos horizontes para os trabalhadores depende de uma intervenção popular, liderada por organizações independentes dos trabalhadores, que aponte para a ruptura dos nós responsáveis pelas mazelas do povo — a segregação social e a dependência externa.
Contrapoder, 21 de outubro de 2019